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Encontro das Águas

 

Paola:
Vamos agora para o cacique, o mestre...


Rodolfo:
O que é que você quer saber de mim?


Paola:
Quero saber o que foi esse trabalho pra você? Como é que você está se sentindo, agora, após a nossa primeira audição do Artigo Oitavo?


Rodolfo:
Nossa, é tão difícil falar. Porque - eu comentei muito isto com a Etel esses últimos dias - esse é um trabalho que acho que eu intuitivamente procurava e intuitivamente encontrei. O acaso, a sincronicidade da vida trouxe pra gente. Que é encontrar um texto vivo, tão - aparentemente - de um jeito, e na profundidade, de outro. Quer dizer, eu descobri... a coisa mais importante é que eu fiz uma amiga, nessa história inteira, né? Isto é difícil nesse grau de intimidade e cumplicidade criativa que a gente conseguiu. Nesse grau que ela mesmo definiu muito bem, como sendo uma etapa de confiança mútua muito grande. Porque a gente partiu de uma coisa pra chegar a outra, muito diferente. Eu descobri um texto aparentemente muito leve, mas muito denso. Eu fui descobrindo mulheres nela, e aspectos da beleza feminina, da índole feminina que ela tem, que me fizeram ficar muito sensibilizado. Isso é uma coisa. Essa é uma grande alegria. A outra grande alegria que eu tenho, é ter estado em contato comigo mesmo o tempo inteiro. Ou seja, ela me propiciou um contato, acho que a gente se propiciou um contato com as nossas próprias almas criativas, com os nossos próprios instintos espontâneos de criação. Nesse sentido, eu fiquei muito impressionado com as sessões que a gente teve aqui: eu, o Caito Marcondes, o André Mehmari, o Cacá Carvalho, o Teco Cardoso e ela, Etel, porque eu achei que aquilo foi uma coisa sem preparação nenhuma, sem leitura prévia (a não ser a minha e a dela), sem direção (a não ser a minha "não direção", vamos chamar assim...) e assim se fez. E assim eu acho que é que se fazem as coisas que possuem uma força que é além da partitura, que é além da canção, e que é isso tudo ao mesmo tempo. Então, isso foi fundamental. É um disco poderoso. É um disco que define, na minha opinião, um princípio de confluência entre a palavra e a música que não é a canção. Mas, ao mesmo tempo, a música está o tempo todo a serviço do texto. O texto está o tempo todo a serviço da música... a música está o tempo todo a serviço do texto...o texto está sempre a serviço da música... E é sempre um impulso daqui contra um impulso de lá. A outra coisa que eu achei maravilhosa foi que ela achou a voz. Pra mim, na hora que eu descobri que ela tinha descoberto a voz, eu falei: "...ih, agora vai dar certo...". Porque ela não se achava no começo. Primeiro, claro, foi talvez muito abrupto eu ter falado e a gente ter discutido o aspecto dela ser a protagonista dela mesma. Ela nunca tinha se colocado nessa situação na gênese do projeto dela. Quando a gente se colocou e quando isso virou objeto do disco, isto é, ela protagonizando o disco, ela tinha que achar quem era ela ali dentro. E ela encontrou de uma maneira que é irrepreensível. Porque o tom com que ela diz, a simplicidade com que ela diz, a voz, que foi ficando de mais aguda para mais grave. Ou seja, ela foi se auto-canibalizando, foi entrando dentro dela mesma, e aí a víscera dela foi comandando e aí você tem a música a serviço disso o tempo inteiro. É um disco de almas, não é um disco de música. É um disco dos espíritos, eu acho.


Paola:
E os medos que surgiram no caminho? Em algum momento passou alguma coisa....?. Porque ela já chegou com uma imagem formada, né? Como foi esse processo, de modificação dessa primeira imagem? Você já tinha uma imagem no começo, do que viria a ser, ou... como é que foi acontecendo?


Rodolfo:
Não. A Etel... a gente estabeleceu um contato por e-mail, que foi se aprofundando. Aí, teve uma hora em que a gente teve que se ver, ela veio pra cá. Ela tinha uma formatação, que rapidamente se desfez diante da energia que a gente tinha um com o outro, das conversas que a gente teve. Eu vou dizer uma coisa, agora é que está me ocorrendo: eu nunca tive medo desse projeto. Eu tive sempre uma íntima certeza que a gente ia conseguir fazer uma coisa que era... - eu não sabia muito bem o que era - mas eu tinha uma certeza intuitiva de que o caminho era esse. A gente chegou para fazer a mixagem, alguns dias atrás, eu disse pra Etel: "eu não tenho uma idéia clara do que a gente fêz". A gente tinha gravado, teve uma parada, eu tive que fazer outro disco, retomamos, e eu nem lembro direito há quanto tempo a gente gravou isto: 1 mês? 40 dias? Eu não lembro exatamente. Então, eu cheguei aqui pra mixar, e cada faixa que eu escutava era uma surpresa absoluta: "... nossa, a gente foi aí, a gente fêz isso?!?..." E isso foi um combustível pra mim! É um pouco assim: por conta de eu, nos últimos anos, ter trabalhado na índole criativa, participativa dos outros, num certo aspecto abri mão, recolhi a minha própria índole criativa. Eu fiz projetos assim, e foi maravilhoso. Mas eu estava um pouco me auto-sombreando. Neste projeto eu me sinto como um protagonista. Eu não digo isto por ego. Eu não tenho o menor ego nessas horas. Mas eu acho que esse é um disco meu e dela. É um disco da nossa comunhão, da nossa descoberta. E ela me descobriu. Eu não entendi nunca porque ela tinha me procurado. Perguntei pra ela, e ela também não sabia. Ninguém sabe. Nisso tudo reside uma mágica muito grande. Então, na hora que a gente deixou esta mágica fluir, na hora que a gente teve a sorte de ter a comunhão desses artistas tão maravilhosos, criativos: o Teco, o Webster, o Caito, o André, o Sérgio, o Lydio, as cantoras - a Suzie, a Cris, a Monica, a Liane, a Nice - a Etel, o Cacá, o Thiago de Mello... todas as pessoas que participaram entenderam. Tinha uma mágica contida ali que a pessoa entrava dentro da coisa. Tinha uma harmonia o tempo inteiro, tinha uma confiança...


Etel:
...tinha o nosso Espírito Santo.


Rodolfo:
É! Nunca teve um momento no disco em que eu tenha duvidado de uma coisa que ela tenha me falado, ou ela duvidado de uma coisa que eu tivesse falado. A gente às vezes tinha um pouco de dúvida, mas a gente chegava junto na mesma coisa. Entendeu? Até ontem a gente estava conversando - eu também não me lembrava mais - como a gente tinha formatado essa ordem de blocos: o Espirito Santo, o Epílogo, o Prólogo. A gente formatou isto também assim, num dia em que eu fui lá pra Curitiba. Eu tinha pensado um pouco, comecei a viajar aqui em São Paulo nas coisas, falei: "... olha, tá acontecendo um negócio..." Aí fui pra Curitiba. Estava numa tarde fria lá em Curitiba, la na casa da Etel, a gente sentou, e em três horas a gente fêz isto: tirou canções que não eram, permaneceram as canções que eram, os textos viraram os blocos, e aí a Etel burilou aquilo e virou o que virou. Eu até agora não tenho muita idéia de como é que a gente fêz, mas eu tinha certeza de que a gente ia fazer.


Paola:
Deixa uma mensagem pra sua nova amiga e prá quem fôr ouvir o disco.


Rodolfo:
Bom, uma mensagem prá Etel: que muitas outras etapas se cumpram. Tenho certeza que isso é uma gênese do que ela está se revelando pra ela mesma. Então não tenho medo de dizer que é uma trilha aberta de caminhos muito, muito longos pra plena realização do espírito dela. É isso. Bom, e prá quem ouvir, que ouça uma vez, mas que ouça essa vez. Se ouvir uma vez, quieto, na postura de receber essa música e trocar com a gente o que a gente quis fazer, eu acho que qualquer pessoa vai entender a grandeza da poesia da Etel.


Paola:
Obrigada.

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Artigo oitavo

Apresentação

O Livro
Prefácio
(por Thiago de Mello)
Poemas

O Disco
Encontro das Águas
(por Rodolfo Stroeter)
Roteiro do CD
Ficha Técnica do CD
Depoimentos
fotos

Agradecimentos
(por Etel Frota)

currículo

contatos

Os Estatutos
do Homem

(obra que inspirou
o Artigo oitavo)

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